A Tribuna do Espiritismo
26 de março de 2021Em razão das abençoadas tarefas espíritas em minha vida, tenho tido a oportunidade de atuar na oratória espírita desde o ano de 2001, e nessas tarefas de divulgação do Espiritismo tenho notado que menos de 5% do público espírita já leu alguma lição da Revista Espírita, e se estendermos a porcentagem para a leitura completa da citada Revista, teremos um índice menor que 1% dos espíritas.
É uma porcentagem muito aquém da ideal, porque a Revista Espírita complementa o pentateuco de Kardec, que é composto pelas obras, a saber: O livro dos espíritos, O livro dos médiuns, O evangelho segundo o espiritismo, O céu e o inferno e A Gênese.
Resgatando um pouco a história da Revista Espírita, que era propriedade exclusiva de Allan Kardec e foi mantida por ele durante 136 meses (de janeiro de 1858 a abril de 1869), convém registrar que a ideia de lançar a aludida revista surgiu após o Codificador identificar a rápida expansão do Espiritismo, que surgiu com o lançamento de O livro dos espíritos, em 18 de abril de 1857, de forma que havia a necessidade de atender o movimento espírita inicial, porque surgiriam muitas dúvidas e questionamentos doutrinários, bem como haveria ataques levianos e gratuitos.
Conforme consta do livro Obras Póstumas (2ª parte – item “A Revista Espírita”), em 15 de novembro de 1857, Kardec manifesta aos Espíritos superiores a vontade de publicar um jornal espírita, recebendo a resposta de que a ideia era boa e que ele deveria se apressar, devendo o jornal atender a curiosidade natural sobre os temas espíritas, assim como deveria cuidar de coisas sérias para atrair o olhar da ciência e também ser agradável a fim de deleitar o vulgo, evitando, ainda, a monotonia por meio da variedade.
Em janeiro de 1858, com o apoio de sua esposa, Amélie Gabrielle Boudet, e dos benfeitores espirituais, ocorre o lançamento da Revista Espírita, e, na introdução, Allan Kardec anota que ela seria uma tribuna, onde ele resolveria fatos e tiraria dúvidas, gerando uma discussão saudável em torno de temas significativos, sempre à luz da veneranda Doutrina Espírita, sem que isso ensejasse qualquer tipo de disputa. Diz ele: “…discutiremos, mas não disputaremos”, até porque, Kardec sempre deixou claro que o pensamento espírita não deveria ser imposto a ninguém.
Sobre a sua finalidade, Kardec ainda fez constar que a Revista Espírita seria o complemento e o desenvolvimento de suas obras doutrinárias, acrescentando que sua forma periódica permitiria a introdução de mais variedades e registraria a atualidade, bem como anotaria as diferentes fases de progresso da ciência espírita e permitiria a inserção de teorias novas que somente poderiam ser aceitas após a sanção do controle universal dos ensinos dos espíritos (Revista Espírita de novembro de 1864–“periodicidade da Revista Espírita”).
Allan Kardec teve a oportunidade de analisar inúmeros fatos, tidos como incompreensíveis, tirar dúvidas de leitores, narrar algumas de suas viagens, abordar livros que chegaram ao seu conhecimento, desenvolver diversas temáticas visando a melhor compreensão das premissas básicas do Espiritismo, etc.
Foi adicionado ao título da Revista Espírita o subtítulo “Jornal de Estudos Psicológicos”, porque Kardec diz que desejaria conhecer a parte metafísica do homem, no seu estado presente e futuro, pois estudar a natureza dos Espíritos é estudar o homem (Revista Espírita de janeiro de 1858 – Introdução).
Na atualidade, tenho visto algumas obras espíritas, mediúnicas ou não, que ferem os princípios espíritas, mas que, infelizmente, têm sido aceitas por parte do público espírita. Tem faltado estudo, por isso, entendo que o estudo das obras básicas, complementada pela Revista Espírita, seria de suma importância para que evitássemos inserções indevidas no corpo doutrinário do Espiritismo.
Outrossim, acredito que somente através do estudo da Revista Espírita é que conheceremos com mais profundidade a pessoa, a personalidade e a moralidade de Allan Kardec.
Dessa forma, cabe aos dirigentes das Casas Espíritas inserir a Revista Espírita como material de estudo, até porque, a diversidade de temas e assuntos tratados pelo Codificador permitirão que a referida revista faça parte dos grupos de estudo, inclusive os que estudam a mediunidade, da evangelização infanto-juvenil, das preleções evangélicas e palestras etc., bastando fazer as conexões com os temas abordados, podendo haver, também, um estudo específico da própria Revista Espírita, seguindo a cronologia ou por agrupamentos temáticos.
É recomendável que se faça, pelo menos, uma vez o estudo da Revista Espírita partindo do início e seguindo cronologicamente até o fim, porque alguns assuntos foram aprimorados ou retificados (poucos – exemplo: se há possessão (depois de certo tempo irá admitir que há); se o Espiritismo é religião (irá afirmar que sim, num artigo de dezembro de 1868) pelo próprio Codificador.
Repito que seu conteúdo é vasto, de forma que nela encontramos textos sobre mediunidade e orientação aos médiuns, obsessão, Deus, fluidos, reencarnação, provas e expiações, orientações para o movimento espírita (havendo diversos discursos de Allan Kardec nesse sentido), estudo dos fenômenos espirituais, comunicações variadas com profundos ensinamentos (Pascal, São Bento, São José, Erasto, S. Luís, Santo Agostinho, Lamennais, Espírito de Verdade etc.), pluralidade dos mundos habitados e outras temáticas doutrinárias.
Sugiro, ainda, a ferramenta (www.kardecpedia.com), que possibilitará a pesquisa de qualquer tema nas obras de Allan Kardec, inclusive na Revista Espírita.
Registre-se que a Federação Espírita Brasileira, em seu site (www.febnet.org.br), oferece a possibilidade de efetuar o download de toda a Revista Espírita e também fornece um índice de temas, que facilita a pesquisa.
Adotando essa postura, evitaremos que a Revista Espírita continue sendo essa grande desconhecida do movimento espírita.
Bendita seja a Revista Espírita, onde podemos encontrar esse complemento indispensável das obras básicas.
* Alessandro Viana Vieira de Paula é juiz de direito, expositor e escritor espírita.